domingo, 25 de setembro de 2011

Variações sobre o prazer, de Rubem Alves



“Albert Camus sonhava com o momento em que ele escrevesse com liberdade total, na orgia anárquica do corpo: “Quando tudo estiver acabado: escrever sem preocupação de ordem. Tudo o que me passar pela cabeça.” Ele não teve essa chance. Morreu antes. Eu estou tendo.”

Dizem que Rubem Alves é filósofo, psicanalista, pedagogo, escritor, mas, antes de tudo isso ele é um educador que provavelmente já nasceu com o dom de ensinar. Em poucas e compreensíveis palavras, explica e explora conceitos, os complicados conceitos, seja escrevendo ou falando, afinal, ambas não passam de uma agradável conversa.

Variações sobre o prazer [Santo Agostinho, Nietzsche, Marx e Babette] é o último lançamento de Rubem Alves, o cara que, como ele mesmo gosta de brincar, Deus já tentou levar daqui algumas vezes, mas resistiu bravamente porque gosta – e muito – da vida. E o que mais poderíamos esperar de um leitor apaixonado de Nietzsche? É a verdadeira personificação do “sim a vida”. A obra, como denuncia o título, é um passeio pelo prazer que a filosofia, a política e a comida podem nos dar.

Com uma rica referência de cinema, música e literatura sendo sugerida durante o livro, Variações Sobre o Prazer é, novamente, uma crítica aos eruditos, ao nosso modelo de educação, ao que a maioria das pessoas entende por ciência, conhecimento e sabedoria. É o amor que Rubem Alves não cansa de declarar à vida, sobretudo, à natureza.

Como quando recebe um microfone na mão, Rubem Alves escreve abrindo parênteses para tudo, inserindo longos comentários que mudam o foco, nos levam para longe e, de repente, como se perguntasse “do que é que eu estava falando mesmo?”, ele nos traz de volta a conversa inicial. É assim que faz a interação prazerosa entre teologia, sabedoria de vida, sabedoria conceitual, sabores, corpo, alma, mente, filosofia, economia, culinária, estética.

Variações sobre o prazer é uma conversa que só tem a nos acrescentar, até mesmo a você que jura que já viu e sabe tudo sobre o mundo. Diferentemente dos que vomitam conhecimentos, Rubem Alves nos leva a refleti-los e admirá-los.

“Tornei-me inimigo dos sonhadores ingênuos que pensavam que bastaria que os homens mudassem suas ideias para que o mundo também mudasse. Moquecas não se fazem só com ideias e intenções. Quem quer mudar o mundo tem de ser um especialista no uso do fogo. Na história, esse uso do fogo tem o nome de política...”

domingo, 18 de setembro de 2011

Lançamento: "Acaba Não, Mundo"


Literatura Coletiva

“ACABA NÃO, MUNDO e outras do www.cronicadodia.com.br”, celebra a longevidade do site na internet e reúne autores para lançamento em Belo Horizonte.

Manter um projeto vivo por treze anos num terreno tão efêmero quanto a internet é uma façanha. E, quando acontece, precisa ser comemorada. Nada mais oportuno, então, que comemorar publicando um livro, já que estamos falando de um projeto de difusão literária, idealizado pelo professor e escritor Eduardo Loureiro Jr.
Trata-se do Crônica do Dia (www.cronicadodia.com.br), site que, como sugere o nome, publica diariamente textos dos novos cronistas do Brasil sob o olhar atento de mais de quinhentos leitores diários.
Estes leitores, agora, poderão ter o Crônica do Dia em suas cabeceiras, graças a uma antologia, organizada por Eduardo Loureiro Jr., reunindo textos de trinta autores que já contribuíram com o site. “ACABA NÃO, MUNDO e outras do www.cronicadodia.com.br”, como foi batizada a obra, será lançada em algumas capitais brasileiras, começando por Belo Horizonte.
O objetivo de lançar o livro em várias cidades é o de possibilitar o encontro e a confraternização dos 30 autores – que estão espalhados por todo o Brasil – com seus leitores. A reunião de entusiastas em prol desta causa, aliás, foi uma característica que marcou todo o processo de produção do livro. A publicação não apenas foi escrita coletivamente como foi custeada por meio do financiamento colaborativo, obtido pelo site catarse.me. Além disso, a capa do livro também foi escolhida em um concurso organizado na internet.
O lançamento em Belo Horizonte acontecerá no dia 24 de setembro, sábado, das 11h às 13h, no Café Com Letras (Rua Antônio de Albuquerque, 781, Savassi - Belo Horizonte), com a presença dos autores Eduardo Loureiro Jr., Felipe Peixoto Braga Netto, Fernanda Pinho e Paula Pimenta (autora da série “Fazendo Meu Filme”).
Posteriormente, o livro será lançado em São Paulo (08/10), Rio de Janeiro (22/10), Brasília (03/11) e Fortaleza (17/11). 



Estarei nos lançamentos de BH e São Paulo. Espero vocês, gente!

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

No Buraco, de Tony Bellotto



Publicado em Setembro do ano passado, No Buraco, o último romance do músico e escritor Tony Bellotto relata a história de um guitarrista de uma banda de rock dos anos 80 que só conseguiu emplacar um único sucesso. Quem narra sua história, é o próprio guitarrista, Teo Zanquis, divertido e frustrado. E, com isso, o guitarrista dos Titãs consegue despertar no leitor a curiosidade sobre o que pode ou não fazer parte também da sua história. Isto é, será tudo mera ficção? A dúvida tortura fãs, o enredo seduz todo leitor que se interesse por aventuras, reflexões e até mesmo um pouco de mistério.

O livro fez com que eu entrasse em crise. Envolver um leitor a esse ponto talvez seja o maior anseio de um escritor e também, vale dizer, sua maior dificuldade. Fácil é produzir algo que alguém simplesmente goste ou não, entretanto, algo que fique martelando lá dentro quando tudo acaba, acredito que seja um pouco mais complicado. Isso prova o quanto Bellotto cresceu no decorrer de suas obras, explorando, cada vez mais, o íntimo de seus personagens e fazendo com que nós, leitores, nos interessemos por eles da mesma forma, ou até mais (e esse é meu caso) que pelo desenrolar da trama em si. 

No Buraco é, em minha opinião, uma grande interpretação de um ditado que me incomoda muito, “nadou, nadou e morreu na praia”. Teo Zanquis parece ter tentado de tudo e fracassado em tudo. Embora seja uma ótima companhia e, aparentemente, excelente com as mulheres, é um sujeito que não só se considera um músico decadente ( e é), mas transformou seu espírito nisso quando, até certo ponto de sua vida, era o contrário. Talvez porque agora ele tenha tempo para pensar, e refletir demais é mesmo angustiante. Por conhecer muito bem alguém extremamente parecido com Zanquis, me identifiquei facilmente e talvez isso tenha contribuído o bastante para a minha avaliação de No Buraco, confesso.

A narrativa apurada, sedutora e bem humorada de Tony Bellotto torna a leitura leve e gera em nós, leitores e leitoras, uma ânsia por terminá-la, consumi-la, o quanto antes. No entanto, não é este o ponto culminante de No Buraco, mas a maneira como Tony aborda a concepção do tempo em cada momento da vida de seu personagem que ora parece julgar tê-lo de sobra, acreditando poder fazer tudo e mais um pouco, e ora se vê lutando contra o tempo. O modo como Zanquis se confronta com o tempo é absolutamente realista e, por isso mesmo, interessante. E foi, sem dúvidas, a principal razão da minha crise existencial pós-leitura. E é por todas essas razões que indico a leitura de No Buraco, um romance divertido e ao mesmo tempo intrigante.

ps: essa resenha foi publicada inicialmente no blog Entretenimente !

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Garotos Incríveis, de Michael Chabon




"Os escritores, diferentemente da maioria das pessoas, contam suas melhores mentiras quando estão sozinhos"


Às vezes tenho a impressão que existem mais livros sobre escritores e seu ofício do que sobre qualquer outro tema. Em apenas uma olhada rápida pra uma das prateleiras de livros da minha estante, identifico três: "Pergunte ao Pó", de John Fante, "Budapeste", de Chico Buarque e "Garotos Incríveis", de Michael Chabon. E se olhasse mais atentamente ou parasse pra pensar por dois minutos, a lista aumentaria exponencialmente.

Mas vamos aqui falar um pouco do último dessa categoria que conseguiu lugar na minha estante. Comprei num sebo, motivada pelo autor, de quem já ouvira falar tão bem. Acho que "Garotos Incríveis" (no original "Wonder Boys", o Wonder aqui sendo sobrenome não adjetivo como na versão brasileira, ou melhor, no inglês existe essa dualidade que se perde no português) vem a ser, creio, um dos romances mais reconhecidos de Chabon, então, seria uma boa maneira de começar.

Wonder Boys, no livro, é o título do romance inacabado do protagonista, o professor universitário Grady Tripp. O protagonista também é o narrador, o que faz que a gente mergulhe na mente de um escritor em volta da conclusão de seu livro, de mais um casamento fracassado, de seus vícios, do seu editor, de seus alunos e de todos seus outros tormentos. E mergulhar na mente de alguém, ainda mais da de um escritor, pode ser confuso e diluído, mas ao mesmo tempo interessante e reflexivo.

A ação do livro se passa em dois dias. Somos guiados pela mente de Tripp até o fim daquela jornada e, por vezes, nos vemos mais energéticos, envolvidos e instigados, e em outras, mais letárgicos, distantes e entediados.


O livro virou filme, estrelado por Michael Douglas e com Bob Dylan na trilha sonora. As sensações que o filme desperta são as mesmas do livro, sendo que no último, como costuma ser, é tudo mais detalhado. Na minha opinião, o que valeu a leitura e o filme foram os momentos sobre literatura.

Uma das partes mais interessantes do livro é quando Grady Tripp nos explica o que ele chama de doença da meia-noite que ataca os escritores, fazendo um paralelo entre eles e os insones. Eu como insone profissional e escritora amadora, me identifiquei total. Fiquem com as palavras de Tripp sobre o assunto:

"A doença da meia-noite é uma espécie de insônia emocional; a cada momento consciente sua vítima - mesmo se escreve de manhã ou no meio da tarde - sente-se uma pessoa deitada num quarto sufocante, com a janela aberta, olhando para um céu cheio de estrelas e aviões, ouvindo a narrativa de uma persiana barulhenta, uma ambulância, uma mosca presa numa garrafa de Coca, enquanto ao redor os vizinhos dormem a sono solto. Na minha opinião é por isso que os escritores - como os insones - são tão propensos a acidentes, tão obcecados com cálculo do azar e das oportunidades perdidas, tão dado à ruminação e à incapacidade de abandonar um assunto, mesmo quando lhe pedem repetidamente para fazê-lo"